quinta-feira, 20 de junho de 2013

Danças e poemas

Foto (poema) de Antonio Carlos Cardoso



Uma série de poemas chamada "Danças"

Hoje, 20/06/2013, publico o primeiro... Do que poderia dizer, também, "poemas guardados". Agora, eles dançam, aqui.

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Das propriedades de dobrar(se) 
                                            
                                                         Luciana Paludo

Tudo que dobra em mim
Desdobra a alma

Quanto mais dobro,
Mais a alma se espicha,
Pois o conjunto de todas as dobras
Gera ondas, onde a alma desliza e passeia.

Dança, alma,
Desliza e passeia
Nessa densidade entre as células e as moléculas de ar.
Quanto espaço há quando se dobra!

Quantos espaços outros
Podem se expandir e acomodar-se,
Mas, não como sinônimo de parar
“Ajustar-se”.

Aí surge a medida de cada gesto, cada passo,
Cada revoada que movimenta o ar...

Faça vento, corpo
Faça vento e
Bagunce

Convoque o espaço, mas
Seja móvel,
Dobre!

Para que possa a alma desdobrar-se e
Estender-se ao outro,
Ao mundo.

Espaço comum...

De todos é este vento
que o corpo faz.
De todos que a intensidade do vento puder alcançar
E calar...
Calar sem deixar mudo
Calar porque o vento também faz dançar e
Desdobra, por assim ser,
Outras almas.

Espaços circundantes que se confundem.

Dobre-se, agora, no seu leito,
Corpo travesso
Corpo que só quer correr e fazer vento.

Dobre-se, também, ao cansaço e à pausa.

Para alimentar...
O vento e as dobras
Que amanhã, novamente
Se farão.

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Poema transcrito de um caderno de anotações no dia 20 de junho de 2013. Escrito em 27 de maio de 2008.

Achei este poema, escrito há alguns anos (como dezenas de outros poemas que tenho guardado em cadernos – penso que está em tempo de publicá-los...).

Eis que, em uma aula/encontro de Estudos em composição coreográfica II, (no curso de Dança da UFRGS, onde trabalho), falava na “propriedade de dobrar”... Entre metáforas e gestos, comentava a eles desse trabalho intermitente de “encurtar as defasagens entre intenção e gesto”, na dança – no caso da composição...
Como nos diz José Gil, “A dança vive da defasagem” (no seu livro Movimento Total, lançado aqui no Brasil em 2004).

Então, li o meu poema a eles... Quiseram uma cópia.
Ingrid sugeriu que postasse em meu blog. Então pensei: por que não?! De repente o blog seja um espaço de compartilhamento de meus poemas... Inspirados, todos, por esta propriedade de “mobilidade” que, creio, vá além do corpo físico...

Eis, então, o primeiro compartilhamento de uma série de poemas que chamarei “Danças”... E as palavras, há tempos, dançam aqui neste corpo.

Lu, POA, 20/06/2013.
*feliz por tantas trocas e dobras.

2 comentários:

  1. É indispensável pensar o corpo assim, para além de músculos e tendões, órgãos de Golgi e reflexos, de faixas para puxar ou pesos para empurrar (esta é a melhor maneira de fazê-lo NÃO dançar...). Há que se encontrar o ar que há entre tudo no corpo. Penso que incorporarei este poema às minhas aulas de alongamento e flexibilidade, como uma ponte entre a "ciência dura" e a "arte" (ainda que eu não aprecie estes rótulos...). Posso, Lu Paludo? Bjs

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  2. Izabela, há tempos não entrava no meu blog... Então, hoje encontrei este comentário seu. Nem imagina como fiquei feliz que essas palavras tantas, geradas pelo movimento (as quais resultam em algumas poesias), puderam - ou podem - gerar outros tantos movimentos!
    Gosto de pensar nos saberes como "camadas" de coisas para uma mesma substância. Assim, o mimese é "coisa", porque não tenho um nome para a dança que faço.
    Beijo e muitas danças para todos nós. Movimento e poesia na vida, é isso.

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