O ofício da
dança está relacionado à produção / materialização de cenas. Dobramos-nos e
desdobramo-nos para isso. Esse texto é um escrito muito simples, em homenagem e
reconhecimento aos trabalhadores que tornam possível que as ideias saiam de
seus esboços e venham a termo, para serem compartilhadas.
Este texto foi
escrito numa manhã de quarta-feira chuvosa em Porto Alegre , em que
preparo uma aula da disciplina Produção Cênica, para os alunos do Curso de Licenciatura
em Dança da UFRGS.
Seja qual
for o âmbito da produção cênica em dança, diria que é um constante exercício de
fôlego, de criatividade e de paciência. Labor minucioso se quisermos alçar voos
mais altos, de modo a podermos materializar o idealizado. E, sobre o
idealizado, por favor, não o subestimem! Idealizar é imaginar; é povoar o
imaginário com imagens/cenas (im)possíveis. Imaginar é, ainda, criar um desejo,
um plano a priori. Imaginar é também
estar aberto para que o a priori se
redimensione, a partir do momento em que começarmos a colocar ‘a mão na massa’
para realizar – e termos fôlego para imaginar
bem rápido outra solução. O que podemos chamar de improvisação, na verdade
são pequenas imagens e planos prévios que se anunciam e se reorganizam velozmente
à imaginação, quando temos um intuito, ou, algo que nos mova a realizar.
E o que nos
leva a querer estar nesse ofício, de produzir cenas? O que é necessário?
Volto à
palavra paciência. Todos os dias. Fazer. A mesma coisa. A mesma coisa?
Será que, ao
repetirmos uma cena [como bailarinos, atores, ensaiadores, diretores etc.], ou,
ao viabilizarmos uma luz, um figurino ou um cenário para a cena estaremos
fazendo a mesma coisa? Ou estaríamos,
nós, atravessando novamente a corda bamba?
Sim, a
tarefa pode ser "atravessar a corda bamba"... Mas, se tivermos que
fazer essa tarefa todos os dias, a cada dia será preciso atualizar o modo de
inventar esse fazer.
Para isso
vamos desenvolvendo artimanhas - que, ao fim e ao cabo, chamamos de técnica(s).
Essas artimanhas
são atalhos. E, com esses atalhos [que se redimensionam, todos os dias, no
próprio exercício do trabalho], podemos começar a jornada incessante de
encurtar as distâncias entre intenção e gesto [tarefa de vida inteira,
diga-se].
Na dança
nada está dado. Podemos ter indicativos do que fazer, mas, até nos protocolos
mais rígidos, esse fazer carece de nossa (re)invenção, a cada dia. Dessa
maneira, "aquilo que não veio", ou "as defasagens" [citando
uma ideia de José Gil, no artigo "O Gesto e o Sentido", no livro
Movimento Total (São Paulo: Illuminuras, 2004)] são aspectos que nos movem a
continuar.
Esse desejo de
produzir e formar cenas nos torna (im)pacientes: como se fôssemos inquietos e
resignados, ao mesmo tempo, pois, como já escrevi num poema "o corpo não
se conforma" (em CORPO = MATERIAL).
*Luciana
Paludo, 11 de outubro de 2017.
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